O baterista dá medo, mas toca bem. O tecladista tem cara de Joey Ramone recém-admitido em algum grupo anarquista italiano. O baixista é a versão nerd do Robert Trujillo. E a dupla responsável pelos metais (saxofone, clarinete e flauta) é, nos dizeres de uma amiga, o Pequeno Príncipe versão adulto.
O show da banda inglesa Soft Machine, gravado no Théatre de la Musique de Paris, na década de 1970, e dirigido por Claude Ventura, era parte do programa Pop 2, da TV francesa. Assisti ao registro em um festival de cinema de rock promovido por uma grife carioca no Estação Ipanema. Noite chuvosa, recém-saída de um apagão e não menos abafada que as noites anteriores. Munido de pipoca e Coca-Cola, sentei, com minha amiga, na sala quase vazia.
Eu havia confundido o Soft Machine com uma banda francesa chamada Magma. Não era nada disso, mas fez parte da mesma cena psicodélica européia. O Soft Machine lembra Smoke e Sun Ra, e tocava um tipo de fusion-jazz-rock, ou algo que o valha. Não é de todo ruim. Mas a menos que você não esteja no seu 57238o cigarro de maconha, ou no seu 25692o ácido, o efeito é meramente antropológico, quando não – é o presente caso – ilustrativo com vistas a alguns parágrafos engraçadinhos.
Quando o filme terminou, entramos em uma temakeria, mas o lugar tocava um reggae à la Shaba Ranks e o garçom tinha jeito de imbecil. Na mesa ao lado, uma moça conversava ao celular com a própria filha, e insistia em dizer que "mamãe" iria "fazer programa de adulto, filha". Entre um acepipe nipônico e outro, eu e minha amiga começamos a desenvolver um projeto de um livro para o público infantil, mas logo percebemos que nossos planos precisavam de mais trabalho.
"Nós podíamos lançar um livro que viria com um daqueles discos coloridos", eu sugeri. "Seria um LP compacto, com duas histórias curtas. Mas se você tocá-los de trás pra frente, você ouviria uma voz cavernosa dizendo algo do tipo ‘Bem-Vindos ao Tenebroso Mundo de Balzebú’, etc.".
Pedimos a conta e caminhamos até o carro.
Eu estava cansado e queria dormir.
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