Os termômetros de rua marcavam 33 graus quando saltei do ônibus no cruzamento da Afrânio com a San Martin. Carregando as comprinhas de Natal, andei até o prédio da minha avó para dar uma alô e contar as poucas novidades da semana. O porteiro/zelador era um nordestino de uns 60 anos, de rosto retalhado pelo sol e pelos tempos, que sempre usava bermuda e camiseta, e se chamava "seu" Zé ou "seu"Antônio, ou algo assim. Abri o primeiro portão com minha própria chave e já me preparava para abrir a segunda, quando a mesma foi aberta antes. Achei que tivesse sido aberta pelo "seu" Zé, "seu" Antônio, ou algo assim. Mas estava enganado. O que surgiu à minha frente me fez lembrar, sem muito alarde ou pânico, da canção homônima do Black Sabbath (vide primeiro e sublime disco da banda...).
Bermuda folgada, camisa de botão vermelha completamente aberta, expondo um barrigão de vagabundo profissional, e chinelos. O que congelava qualquer espinha dorsal pouco experiente, entretanto, eram aqueles olhos azuis e aquele olhar de assassino, o todo encravado em uma armação de óculos fina que, por sua vez, se equilibrava em uma cabeça quadrada cujo único adorno era uma cabeleira loira e encaracolada.
Sem nome, sem profissão, e, até prova do contrário, nenhum som emitido por aquela boca de lábios finos e pétreos. Tudo que sei é que o sujeito bizarro mora no segundo ou terceiro andar, fuma feito uma chaminé – o jardim da minha avó agradece as inúmeras guimbas... – e vive às turras e aos berros com os pais (o pai faleceu há uns dois anos, e o cara mora com a mãe, uma senhora que sai para almoçar pontualmente ao meio-dia no self-service da padaria...).
Minha avó jura pelo sangue de todos os times do América F.C. que o bizarro em questão tem problemas com drogas, álcool e jogatina. Ou seja: o sujeito é bizarro E uma bomba atômica ambulante. Não diz uma palavra sequer, dá pequenas saídas pelo quarteirão, e volta para a sua toca com a mesma e sinistra desenvoltura.
Me pergunto se sou o único morador do Leblon a ter certo receio desse cara. Sei de gente que sente medo de outras pessoas – vizinhas ou não – neste bairro com fama de pacífico (arrastão não vale, pois é "movimento social"...). Mas sinceramente: só vendo o cara pra entender o que eu sinto. Cá pra nós, se o cara tivesse aquele jeitão e uns 70 ou 80 anos, eu não pensava duas vezes antes de fazer um monte de xerox com o título "nazista à solta". Vade Retro...
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